Mundo Surreal

terça-feira, 13 de março de 2018

5 minutos

Sexta-feira, 18h53.
Estaciono longe, não têm muitas vagas. Uma ambulância passa por mim enquanto me dirijo ao PA. Entro aproveitando a passagem deixada por um rapaz que abre a porta e sai, com um dedo de luva no nariz e muito sangue na camiseta. Conheço o porteiro. Pego a chave e abro a porta por onde entram as macas trazidas pelo SAMU. Reparo que agora a porta não fecha direito e lembro que semana passada um acompanhante enlouquecido com a demora pelo atendimento jogou uma pedra na porta. Fecho do jeito que dá e, ao virar, me deparo com três macas do corredor em que os pacientes aguardam atendimento. Duas das pessoas que esperam nas macas estão com colar cervical e completamente imobilizadas. Uma delas dorme enquanto a outra, um senhor de cerca de 60 anos, grita algo incompreensível. Nas cadeiras estão mais quatro pessoas: uma criança que brinca com o nariz da mãe, esta tentando desviar a atenção da garota do corte no queixo que certamente ocasionará um belo escândalo em alguns minutos; um homem com a mão enfaixada e muito suja de graxa e sangue, que tem o olhar fixo no vazio e parece não ouvir a moça ao seu lado falar muito alto ao celular para suplantar os gritos do senhor na maca. Desvio das macas e empurro a porta que dá para o consultório, bem a tempo de desviar de um interno que pega no armário materiais para sutura. Cumprimento-o e ele acena de volta, como quem acena para um resgate. Acho graça. Passo por um homem com um olho muito vermelho, que me olha e certamente reza para que eu seja o oftalmologista que ele aguarda há mais de duas horas. Não sou. Saio para o corredor central do PA, onde estão dispostas macas em ambos os lados, margeando uma pequena passagem pela qual enfermeiras se espremem e distribuem medicações. Passo por uma enfermeira que olha, muito intrigada, uma prescrição e em seguida a abandona e grita o nome de um medicamento para a janela da farmácia, onde ninguém a escuta, pois a farmacêutica está ocupada atendendo a janela da emergência, na qual uma jovem médica solicita, histérica, ampolas e materiais. Mais afrente me detenho diante de uma mulher em uma cadeira de rodas, com a perna engessada, que olha com cara de nojo um paciente que acaba de vomitar algo bem escuro no quarto ao lado. Peço licença, ela repara minha existência e desajeitadamente sai do caminho. Entro na sala dos médicos, ontem quatro plantonistas conversam e assistem TV. Pego meu uniforme e vou para meu plantão. Já se passaram 5 minutos.

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