Mundo Surreal

sábado, 6 de agosto de 2011

Quadrilha

João  Sabino era um homem trabalhador. Sempre enfiando as mãos grossas de cal e cimento ressecado  por entre os tijolos do ofício, e sempre os pés pelas mãos também. É claro, é mais que justo que vez ou outra acabe tendo que subtrair certa quantia do ordenado da obra para saciar seu pequeno vício do cigarro. Roubar jamais! Subtrair. Mas João Sabino tinha um pequeno duplo problema que o afligia desde pequeno: era vesgo. Mas não um estrabismo leve, que passa despercebido pelas pessoas, e sim uma vesguice gritante, de modo que as pessoas que não o conheciam se assustassem ao encontrá-lo na rua.

Apesar de seu tão singelo defeito, João Sabino tinha um amor: Maria das Dores. João amava Maria, que também tinha um pequeno problema, quase tão inescrupuloso quanto o estrabismo do seu amado. Maria das Dores tinha a boca torta. Tão torta que parecia querer morder a própria orelha, ou que estava usando brinco de língua. Os dois se amaram até que o destino contemplou João Sabino com dez mil reais e muita disposição em um sorteio. Depois de uma cirurgia tão demorada quanto complicada, conseguiu corrigir quase que completamente a vesgueira.  A operação pareceu ter surtido algum efeito pois todo o amor que ele sentia por Maria das Dores desapareceu em um piscar de olhos. Agora ele só enxergava Ana Cleuza.

Ana Cleuza tinha quatro dentes podres...

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